Escrevi durante vários anos, até que a linha secou, e deixei de ter a capacidade de juntar frases com o mesmo gosto. Com isso, estou certo, estragou-se a minha escrita, perdi qualidades, ou se não as perdi, passei a escrever outras coisas, mais cinzentas e formais, à medida que me tornei num burocrata, enleado em normas, a descrever condutas censuráveis e outras permitidas (quando não mesmo daquelas que se fazem obrigatórias).
A vontade de voltar persegue-me há algum tempo, e é a propósito de condutas, das censuráveis, permitidas e obrigatórias, ainda que de modo algo indirecto, que me sirvo para me forçar a alinhar palavras novamente, longe de onde se ganha o pão, agora a escrever, aqui, por mero prazer – mais que um mero gosto, eu gosto mesmo é de prazer.
Não acompanho celebridades – o conceito conduz-me ao bocejo – mas é difícil passar ao lado da Bianca Censori, que uma pesquisa rápida me diz ser australiana, arquitecta, da casta de 1995, mas que chega ao meu conhecimento pelo facto de se passear em diversas modalidades de despida pela praça pública. Mesmo quem, por norma, não vê televisão e não segue gente conhecida em redes sociais, como eu não sigo, acaba por passar os olhos por fotografias da senhora, porque os algoritmos acabam por no-la colocar na mira.
A mais recente ocasião foi a propósito da passadeira vermelha em que se apresentou, ao lado do marido, nos Grammys (de fevereiro de 2025), vestindo praticamente nada. Melhor, envergando uma-espécie-de-vestido totalmente transparente, de tal modo que toda a sua pureza se vislumbrava e a imaginação ficava mais despida que a própria. Não sendo puritano, não fiquei ofendido pela visão, senão algo perturbado, e não foi imediato, para mim, o porquê desse incómodo – ainda que se pudesse discutir muita coisa, no domínio da moralidade, da privacidade, da dignidade, mas creio que nem foi por aí que a minha apreciação seguiu.
Dei por mim a pensar que a senhora não desperta, apesar da sua aparente saúde física, qualquer tipo de interesse sexual. A princípio pensei que fosse pela ausência de surpresa, pela oferta despudorada de tudo quanto ali existe para ver. Se nada há a descobrir, nada há a buscar. Poderia ser isso, mas depois percebi que estava a sentir algo diferente: desconfiança.
Deixemos de lado o facto de toda aquela encenação ser uma operação comercial, e o que me sobra é a sensação de tudo naquela figura ser fabricado, plástico, e muito provavelmente doentio em algum grau. E isso é, para mim, o começo da resposta: aquela mulher, jovem e de bom aspecto, não me atrai porque não me surge como sã. Desconsiderando até o facto de as suas mamas serem marcadamente excessivas para as mãos que detenho – que confortam um 38B, talvez um pouco mais -, o que acaba por determinar o meu desinteresse pelo seu corpo e pela sua existência enquanto mulher e objecto de desejo sexual, é o facto de eu a considerar perigosa.
Arrisco dizer, sem jamais ter pensado muito nisto, e ainda menos o ter estudado – i.e., procurado e lido algo sobre a matéria, entre aqueles que se dedicam à psicologia -, que os homens não se sentirão particularmente atraídos por mulheres que julguem ter alguma perturbação mental, excepto se eles mesmos tiverem similar condição que os impeça, ou dificulte, compreender a saúde mental da mulher que têm à sua frente. Porquê? Porque uma mulher mentalmente insana é uma mulher perigosa.
Uma mulher insana é uma mulher que criará problemas. Será instável no seu comportamento, encontrará problemas e conflitos onde não existem, e ampliará os que existam, será possivelmente mais insatisfeita e dada a comportamentos mais extremos, será, em suma, uma fonte de incerteza e problemas. Coisas que um homem, em rigor, não quer. Diria que uma mulher também não quer isso num homem, mas compreenderão que me falta apetrecho para o asseverar, já que os meus cromossomas me fazem um dos dois únicos géneros que o mundo conhece (quem conhece outros, está num mundo diferente), e o meu não é o feminino, pelo que resulta óbvio o meu viés.
Quando observo Bianca no tapete vermelho dos Grammys, praticamente nua em público, não vejo uma mulher sensual que desperta erotismo e, vá lá, sexualidade animal, em mim. Vejo uma pessoa perturbada, fonte de problemas. E isso, concluo, é um impedimento. É um sinal de sentido proibido – que não é fruto, e portanto não é apetecido.
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